segunda-feira, 5 de setembro de 2011

174 motivos para se tornar um criminoso



O filme 'Última Parada 174', exibido neste domingo (04/08) à noite na tv aberta, é um tiro no coração da sociedade brasileira. É a constatação de que somos nós, do alto do nosso comodismo, e os políticos que elegemos, que nada fazem em prol da melhoria da realidade social do país, os responsáveis pela produção em massa de Sandros em todo o território brasileiro.

O sequestro do ônibus 174, no bairro do Jardim Botânico no Rio de Janeiro, comoveu toda a mídia nacional e a população, que não desgrudou da tv para assistir o desenrolar do episódio. O incidente, que ocorreu no dia 12 de junho de 2000, durou cerca de 5 horas e resultou na morte de uma refém e do sequestrador, naquele momento conhecido, apenas, por Sandro.

Seria óbvio pensar que a refém foi morta pelo 'bandido' e que o rapaz morrera durante a operação. Ledo Engano. A jovem foi atingida por um policial 'cego', que errou um tiro a 1m de distância e acertou o queixo da professora. Assustado, Sandro alvejou a jovem com mais 3 tiros nas costas. Colocado no camburão, Sandro foi morto por asfixia. Um ano depois, os policias foram julgados por assassinato e declarados inocentes.

O que ninguém sabia, e que depois viria a sensibilizar uma parcela da sociedade - o que resultou na produção do documentário 'Ônibus 174' e no longa citado no início deste post - é que Sandro Barbosa do Nascimento estava fadado a este destino. Desde novo, a vida lhe tirou a chance de ser
feliz, transformando-o em um menino instável, viciado em drogas.

Muito novo, o jovem presenciou a morte da mãe, morta a facadas. Anos depois, em 1993, morando na rua, foi um dos sobreviventes da chacina da Candelária, que vitimou 8 moradores de rua.

O episódio deveria ter feito a massa política do país criar vergonha na cara e desenvolver estratégias para que não surgissem novos Sandros, mas o que a gente vê por aí é uma profusão de Sandros, Josés, Antônios, Márcios, Joãos, que têm a infância ceifada pela extrema pobreza e violência imposta por uma sociedade extremamente consumista, capitalista, racista e, acima de tudo, egoísta.

Uma observação: em novembro de 2001, a linha 174 mudou de número para 158.

3 comentários:

Milena Leal disse...

Resca, muito boa a análise. Concordo com você em quase tudo. Também acho que "nós" somos os culpados de muita coisa que acontece nesta cidade, estado, país e mundo. Mas, não podemos justificar todos os atos ensandecidos, como este do infeliz Sandro. Até mesmo porque, assim como ele, outras milhões de pessoas no Brasil passaram e passam pela mesma situação de vida - sem dinheiro, sem educação, sem oportunidades, entre outros fatores - e, ainda assim, preferem vivê-la de forma digna. Conformada, pode até ser, mas, digna. No entanto, não quero me ater a esta questão. O fato é que, é verdade, estamos omissos, despreocupados, relaxados, displicentes e desleixados.

Como comentei há pouco tempo com você, Cris e Carlos, estou me sentindo inútil. De uns meses para cá, ando buscando aquela Milena pseudo-revolucionária que sonhava em mudar o universo. E a busca tem me levado à uma conclusão tão triste quanto a trajetória de Sandro: estou invisível, mas, neste caso, não por falta de oportunidades, e sim por falta de vontade, ideologia e vergonha na cara. A inércia está tomando conta de mim. Que tal mudarmos esta nossa conduta?

Vamos, ao menos, utilizar as ferramentas que estão à nossa disposição para propagar as nossas ideias e a nossa visão e tradução de mundo.

Eu acredito que podemos fazer a diferença, e te parabenizo pela iniciativa em atualizar o blog com um assunto polêmico e corriqueiro da nossa trajetória. Para começar (podemos fazer muito mais que isso, e nós sabemos disso), acredito que já está bem direcionada!

Mão na massa! Juntos somos fortes!

Beijos,

Mil! ;)

Na Ponta da Língua disse...

Nossa! Adorei que tenha comentado no BLOG Mil. Adorei ainda mais perceber que você tem muita razão no que disse.

Vamos tentar mudar as coisas, sim! Temos que lembrar que, como jornalistas, podemos ajudar a esclarecer o povo e que nossa palavra pode ter peso sobre o futuro do nosso país.

Obrigada por comentar no blog!

Beijos e força para todos nós!

O universo conspira a nosso favor!!!

Narguilé Art & Design disse...

Milena, concordo em gênero, número e grau com seu comentário. A vida é feita de possibilidades, caminhos e escolhas também, não podemos cair no fatalismo total. Corroboro com a urgência de uma atitude mais " revolucionária", está faltando isso nas nossas gerações, inércia total.E aí meninas, e o jornalismo "investigativo", compromissado e que vai fundo no pq das coisas? Cada vez que vejo jornal, por exemplo, fico escandalizada com a superficialidade das matérias, a unilateralidade e o breve ou nulo incentivo à reflexão, afe!Conto com vcs nessa! Bjus.